Andando bamba na linha do dia com uma irritação grande nos olhos pensei na música que me sairá da boca e no acorde que cairá do pinho daquele violão, o qual nem conheço mas sei, trará a vontade de gritar um adeus, batucada!, bem forte. Segui caminhando, entre a sala da biblioteca e o barulho dos pássaros na 409 N. A irritação aumentava e percebi que no dia seguinte seria meu aniversário, o qual odeio comemorar e, por vezes, esqueço-me de que as pessoas se ofendem por não receberem um parabéns irradiante com sorriso no abraço. O esquecimento sempre me vence e sinto vergonha.
Vó Maria disse-me uma vez: Bem se vê que você não faz da vida um relógio apressurado . Achei bonito.
Continuei caminhando, resolvi contrariar a contigência do excesso de trabalhos na universidade e reservei um fado para a noite seguinte. Lugar pequeno, apesar do vinho caro. Comecei a noite vendo personagens do Altman falando em voar, ao lado do danado do frio num dos cantos largos da cidade. Saindo me senti mal, muito mal, por escutar num fundo raso a voz de um amigo costurando a vida de uma tal memória. Segui até o carro numa mudez que sentia, com egoísmo e mal humor bem distribuídos em cada canto de minhaarrepiada pele, as frases dele se enrolando em mim. Cobriam-me a tapas com uma falta de sentido raivosamente quente por eu não querer ler o significado delas. Irritei-me, outra vez e mais fundo, como nunca havia acontecido desde que o conheço.
Mastigando uma comida de Guiné Bissau, em pé e ainda com o frio melecado na nuca, escutei sobre uma tal ruína que existe no meio de um mato, no rumo de baixo da CEU, após aquela estrada asfaltada que dá pra não sei onde. Disseram-me, mangando, que fora o projeto inicial de Brasília e que jk o rechaçou em sua primeira visita devido ao oco de magnanimidade da construção. Comentaram-me que provavelmente após isso o projeto de niemayer tenha sido aprovado. Reiniciaram a construção do zero em outro lugar e só então Brasília começou a ser filmada pela jocosa estoriografia oficial. Achei bem possível, apesar da graça. Aliás, lembrei-me do susto que tive com a imagem criada pelo documentário do seu Manfredo, pai do Jesus, de que na construção dos prédios da esplanada os corpos dos vaqueiros voavam, dia a dia, hora sim hora não, e eram enterrados ali mesmo, entre os alicerces que, embora calassem as bocas à tiros, embotavam os olhos de cimento e lágrimas, sem nomes. O silêncio da gente que sonhava afastando-se da família para perder-se na vida em prol da ilusão da modernidade construída à golpes de régua e de falta de cor me machucou o peito. Agora todos os dias em que, dentro do ônibus, desço a ladeira ao lado do edifício do congresso aperto o ferro do banco da frente com as mãos suadas de agonia. Sinto frio na barriga como se fosse medo. De voar, talvez.
Hoje acordei às